PENSANDO EM VOZ ALTA
Administração danosa
2 - A punição não tem lugar se o dano se verificar contra a expectativa fundada do agente. Pensemos, então: O nº 2 do artigo 235º traduz uma válvula de escape para qualquer gestor público ou político que obtenha maus resultados de gestão ou de administração no âmbito da "coisa" pública. Os deputados de todos os partidos não são parvos e com aquela redacção preveniram que o Político apanhado com as calças da sua administração nas mãos possa ser incomodado, pois sempre poderá alegar: "Ah e tal, foi a crise internacional, eu fiz o melhor que sabia e não podia contar com a falência do Salomon Brothers". Por esta via, parece que não podemos apresentar queixa no Ministério Público contra Sócrates pelo crime de administração danosa. Ele sempre poderá alegar coisas como aquelas. A imprevisibilidade do dano devido a factores que ele não controlava nem causou directamente. Porém, existe uma situação especial que talvez valha a pena explorar:
1. Desde o Verão passado que o Governo afirmava publicamente que a partir dos 7% seria necessário o recurso a ajuda internacional, pois os juros deixariam de ser comportáveis. 2. Porém, a barreira dos 7% foi ultrapassada e só com os juros a mais de 10% e após vários meses completos é que Sócrates, finalmente, pediu aquela ajuda. 3. Ora bem, parece que é pela própria boca do Governo que se reconhece a necessidade de recorrer a ajuda após ultrapassar a taxa de 7%. Mas isso não aconteceu nem com prontidão nem com cuidado. 4. Entretanto, sabemos pelas notícias que só a diferença em juros dos 7% para os 10 % que se pagaram a mais por se ter adiado o pedido de ajuda corresponde pelo menos a 500 milhões de euros. 5. Nesta parte, parece que o Governo não poderá esconder-se atrás do nº 2 do artº 235º do CP, pois que o dano traduzido nos juros que a mais se pagaram, podendo pagar-se menos, não traduz um dano que se tenha verificado contra a expectativa fundada do agente. 6. A expectativa fundada que existia aconselhava exactamente a praticar o contrário do que Sócrates praticou. 7. Parece que o homem infringiu intencionalmente regras económicas de gestão racional só para tentar manter-se no poder, sendo que todos os economistas antecipavam a necessidade do pedido de ajuda externo. 8. Já agora gostaria de ver a lábia do homem num Tribunal, a ver como ele se explicava perante quem sabe mais do que ele. Que, com os estúpidos, o tipo tem-se safado razoavelmente. Entretanto tenho que confirmar se a versão editada acima corresponde à versão mais actualizada do Código Penal. É caricato, mas um dos problemas dos práticos de hoje é saber, de forma segura, qual a versão da lei em vigor. Quem quiser ajudar na busca, por favor encaminhe os links das notícias destinadas a comprovar a tese supra exposta, em especial, as declarações de Teixeira dos Santos e de Sócrates sobre os 7%, cronologia do aumento dos juros, valor dos juros pagos a mais, etc. Numa abordagem liminar, parece que a coisa tem pernas para andar.
3 Comments:
Ora viva! E que seja por muito tempo a brindar-nos com a inteligência e a clareza dos seus escritos. Sei que agradeço em nome de muitos, mesmo que ninguém me tenha passado procuração.
Não é nada que já não me tenha passado pela cabeça, a hipótese de esta gente ser responsabilizada criminalmente pelo que anda a fazer há muitos anos. Não tendo conhecimento na área das leis e pela pesquisa que fiz, nada encontrei. Força Carneiro, é avançar com isso!
PS. Folgo em saber que continua a escrever.
Obrigado.
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