EDITORIAL 25 DE ABRIL
No passado sábado, botei discurso num jantar de 'velhas glórias'. Fiz referência ao 25 de Abril e à Liberdade. Em reflexo condicionado, recebi três recados (ou reparos ou o que se queira chamar) de pessoas diferentes sobre uma minha hipotética viragem à 'esquerda'. Ora, convém esclarecer o seguinte:
No Portugal da III Republica, a ciência política tem sido a maior das trapalhadas, pois nunca conseguiu estabelecer na mente do cidadão comum as diferenças essenciais entre "esquerda" e "direita". Não vou obviamente meter-me nessa tarefa. Até porque para lá de clarificar conceitos, ainda tinha que desfazer as confusões.
Reduzindo os conceitos à sua essência, tenho para mim que uma postura cultural de "direita" privilegia a Liberdade, enquanto uma postura de "esquerda" valoriza a Igualdade. A primeira sobrevaloriza a Liberdade individual, enquanto a segunda tudo subordina à tendente Igualdade entre os cidadãos.
A Liberdade individual tem sido o valor essencial do meu percurso sócio-cultural. E também profissional e político. Até porque profissionalmente só posso actuar em contra-poder, só posso exercer o meu magistério no confronto total com o Estado e com as prorrogativas de limitação da Liberdade (até física) do Cidadão.
Por outro lado, vai sendo cada vez mais pacífico que a grande - diria a única - conquista significativa do 25 de Abril foi a Liberdade. Porque as demais assim classificadas não passaram da incipiência ou foram sustentadas transitoriamente a crédito. E foram caindo uma a uma.
Por isso, me identifico com a Liberdade que o 25 de Abril representa. É que a Liberdade é um conceito essencial da "direita". A Igualdade, normalização ou estandardização e os colectivismos, em especial, os culturais que estabelecem o "politicamente correcto", é que são conceitos típicos da "esquerda".
Esta estrutura essencial nada tem a ver - ou muito raramente tem - com as forças partidárias que, no seio de cada uma, fazem surgir afirmações de todo surpreendentes. Por exemplo, o CDS-PP a defender a economia subsidiada por fundos públicos e a aceitar a nacionalização dum banco, é um contra-senso doutrinário. Do mesmo modo, que o PCP a saudar a Liberdade é uma contradição nos termos. A única liberdade que interessa ao PCP é a liberdade-táctica para atingir o poder; a partir daí a coisa vai até aos Gulags, como é histórico. Por seu lado, os partidos "da governação" misturam tudo num caldo caótico, onde apenas se identifica como linha condutora a tentativa de chegar ao poder e a sua manutenção por todos os meios possíveis. Coisas como "socialismo em liberdade" é um contra-senso inultrapassável. Os conceitos anulam-se reciprocamente. E a afirmação dum partido "popular democrático" traz-me à memória a Coreia do Norte. Mas tem sido essa confusão doutrinária que nos tem governado. Não admira que o resultado seja o actual.
O 25 de Abril que amanhã completa 35 anos significa Liberdade. Em especial a Liberdade de eu poder escrever estas coisas sem que a polícia me apareça à porta para me levar preso. E essa conquista tem que ser por mim valorizada em qualquer circunstância.
As demais "conquistas de Abril" - assim definidas pelo "politicamente correcto" - foram um equívoco. Muitas vezes impulsionado pela ignorância, em especial dos jornalistas que tinham a obrigação de apontar a nudeza do rei. Aliás, como as pessoas agora estão a sentir de forma tão dolorosa que já não dá para disfarçar.
Por isso, assumindo-me culturalmente como um Homem de Direita, agradeço a Liberdade que o 25 de Abril trouxe a esta maltratada Pátria. Porque a falta de Liberdade no Estado Novo, não era uma prática de "direita". Era uma prática de "esquerda".
Aos intelectuais que por aqui passam, saliento que não elaborei um texto doutrinário, nem tive pretensões de lançar teses. Antes tive o cuidado de escrever simples para esclarecer em especial alguns equívocos que um discurso num jantar de "velhas glórias" terá causado a algumas pessoas no Bombarral.
Por isso - e porque a Liberdade não se celebra, vive-se -, amanhã vou aproveitar a Liberdade do feriado com os meus filhos. Embora com o coração apertado com o futuro miserável que eles vão ter a pagar a factura das "conquistas de abril".
4 Comments:
Carneiro,
estou de acordo contigo: a única conquista remanescente e que tem pernas para andar é liberdade de expressão(essa ninguém me parece interessado em cercear):valor inestimável.
Haja saúde!
ups!
Olá Xiclista,
Em conversa privada entre nós, a propósito de coisas do Café Veneza, aludi a uma certa macieza da tua parte em relação ao 25/4, não no jantar, mas aqui no blogue.
De forma alguma inferi que agora passaste a ser de Esquerda. Os tempos já não são de radicalismos, e, de jovem absolutamente avesso a tudo o que fosse "canhoto", que eras, vejo-te homem ponderado que reconhece com sensatez tudo o que expuseste neste teu texto admirável e que subscrevo.
Perdeste, tu e muita gente, e ainda bem, o sectarismo, que já só é cultivado no supracitado café, entre reaças da velha guarda, que olham de soslaio um parceiro que apareça de pulover encarnado. Inacreditável, mas verdadeiro! É a doença da Política...
Eu nunca me interessei muito por Política, mas partilho das tuas reservas em relação aos conceitos de Esquerda e Direita. Como anarco-conservador que sou, tudo isso me passa um pouco ao lado. A Esquerda da solidariedade é-me cara, mas a Esquerda da inadmissível intromissão na liberdade pessoal e na vida privada, acho-a execrável. Aí dou toda a razão à Direita.
Os países normais não têm revoluções, mas nós precisámos desta, por isso há que assumi-la. Pessoalmente não a comemoro. Como diz Vasco P. Valente, seria o mesmo que comemorar o primeiro ataque de varicela, uma desagradável doença de crescimento.
Em todo o caso, Viva a Liberdade! Não há bem mais preciso!
M.
Não tenha assim tanta certeza de que não irá preso.
Censura prévia já está montada,
E não esqueça as ameaças de Jorge Coelho, e Augusto Silva e o Sócrates têm proferido.
Não seria o primeiro a responder pelas suas opiniões.
Infelizmente eles clamam liberdade, mas só para eles
Muito bem dito.
Sem mácula!
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