SAIR DO EURO
Artigo de
"Comecemos pelo que aconteceria no caso de uma saída do Euro. Em
primeiro lugar, convém notar que uma saída nunca seria referendada ou
sequer discutida em avanço. Os líderes políticos teriam que negar essa
possibilidade até ao fim. No momento em que fosse sequer
discutida, pessoas e empresas começariam imediatamente a levantar os
seus depósitos e colocá-los fora do país, levando a uma espiral de
problemas financeiros e bancários que forçariam a saída do Euro e
agravariam as suas consequências. A decisão de saída teria de vir de
surpresa, muito provavelmente numa sexta-feira à noite. O Banco Central
ordenaria a conversão imediata de todos os depósitos bancários sediados
em Portugal de euros para a nova moeda que fosse criada. O pagamento de
salários e todos os contratos comerciais vigentes também seriam
convertidos para a nova moeda. A dívida pública emitida ao abrigo da
legislação portuguesa também seria convertida para a nova moeda.
Enquanto o processo decorreria, os levantamentos bancários seriam
suspensos. Se o fim-de-semana não fosse suficiente para acabar o
processo de troca de moeda, os bancos manter-se-iam fechados mais uns
dias. Para evitar a fuga de euros para fora do país, também as
transferências bancárias seriam proibidas. Quando os bancos
reabrissem, já os depósitos estariam redenominados na nova moeda e todos
os levantamentos em numerário seriam realizados nessa moeda. A taxa de
câmbio da nova moeda em relação ao euro cairia 20-30% no primeiro dia em
relação à taxa utilizada na conversão de depósitos. Ou seja,
efetivamente os salários, apesar de não caírem na nova moeda, iriam cair
20-30% quando contados em euros.
No que toca à dívida pública, a situação seria mais complicada: O
governo poderia manter as suas obrigações em euros, ou seja, perante a
desvalorização da moeda, a dívida pública ficaria ainda mais difícil de
pagar ou, alternativamente, converter a dívida para a nova moeda, o que
os credores veriam como um incumprimento (default). Este default faria
com que o Estado português deixasse de ter acesso aos mercados
internacionais. No entanto, o facto de agora poder pagar na nova moeda
e, portanto, ser mais fácil reequilibrar as contas públicas,
provavelmente faria com que o governo optasse pela segunda opção. Nos
primeiros meses seria também provável que viessem a faltar alguns
produtos importados nas lojas. Como as empresas importadores teriam as
suas contas também convertidas para a nova moeda, mas precisam de euros
para comprar bens ao estrangeiro, teriam algum problema em repor os
stocks. Mesmo que os produtos chegassem sem problemas, eles seriam
bastante mais caros. O preço de tudo o que é importado (incluindo
combustíveis, telemóveis, computadores, alimentos, etc.) subiria em
flecha na nova moeda. A austeridade como a conhecemos hoje acabaria:
Provavelmente o governo anunciaria um aumento de salários e pensões cujo
efeito seria rapidamente eliminado pelo aumento dos preços da maioria
dos bens. Teríamos antes uma austeridade disfarçada, onde o rendimento
nominal parecia crescer, mas o empobrecimento resultante da diminuição
do poder de compra se sentiria sem disfarce.
Seria perfeitamente possível que o país se recompusesse ao fim de
alguns anos; talvez adquirindo a maturidade política e económica
necessária para reentrar na Zona Euro, desta vez sem os mesmos
problemas. Mas, que não se iludam aqueles que acham que seria uma
solução fácil: O nível de empobrecimento e atraso económico
causado seria bastante superior e mais rápido do que qualquer programa
de austeridade."
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