DEFLAÇÃO

"Pela primeira vez em meio século, a taxa de variação homóloga do índice de preços no consumidor escreveu-se no mês passado com um valor negativo. Os analistas dizem que este é um fenómeno que veio para ficar, possivelmente até ao fim do ano, mas que é muito cedo para falar de deflação. Para já, asseguram, são só boas notícias para os consumidores." - in Jornal de Negócios

A história absurda do "cavalo espanhol" - para quem não sabe, era um cavalo que por comer muito foi objecto de sucessivos cortes na ração, até que morreu por falta de comida levando o dono a exclamar "Que pena, agora que estava tão barato, é que morreu"... - ilustra o fenómeno deflacionista.

Os consumidores não têm dinheiro disponível e compram menos produtos. Os produtores e fabricantes para induzir as vendas baixam os preços. E quando o fenómeno de baixa de preços se generaliza, os consumidores, que até tinham algum dinheiro para comprar alguns produtos, como sabem que os preços ainda vão baixar mais, adiam o momento da compra. E os produtores e fabricantes baixam cada vez mais o preço, até ao limite. A partir de certo momento já não compensa ao fabricante ou produtor produzir por preço tão baixo e fecha a fábrica, causando maior desemprego. E os produtos que antes produzia, deixam de existir no mercado.

A médio prazo essa carência faz disparar o preço desse bem, mas já é tarde. Quem antes o produzia, faliu, já não o produz, e esse bem torna-se escasso. E por ser raro atingiu preços tão elevados que os consumidores - grande parte no desemprego - não têm dinheiro para comprar.

Imaginemos que o produto corresponde a batatas ou a arroz e veja-se o que pode acontecer ao mundo.

O agravamento do fenómeno é essencialmente psicológico. Do âmbito das psicoses colectivas. Daí que haja o cuidado de se dizer que, actualmente, ainda não se está em deflação, pois que a baixa dos preços se deve ao mercado do petroleo - que em seis meses baixou de 150 para 50 $USD. A explicação faz sentido. Mas o perigo de deflação existe.

E como se combate uma deflação ? Só há um meio: a inflação monetária, que consiste em injectar na economia doses massivas de dinheiro em papel fabricado pelos Bancos Centrais. Os consumidores passam a dispor de mais dinheiro e perante a escassez de produto no mercado, ainda conseguem comprar algum, estimulando a produção e a oferta. Que, por sua vez, cria emprego e retoma o círculo por esse lado.

Só que a emissão de moeda provoca a médio prazo taxas terríveis de inflação. E superada a crise deflacionista, ficamos com uma crise inflacionista, na qual o nosso dinheiro passou a valer muito menos do que valia antes. Em termos de salários, de poupanças e de fundos de aposentação é fácil perceber-se a degradação do valor relativo do nosso actual rendimento disponível.

Volto à minha: quem tem uma leira de terreno, não a venda. E quem não tem essa base cultural e familiar, é bom que compre o Bordadágua para aprender a semear batatas e a plantar couves. E uma coelheira e um galinheiro também não farão mal à economia doméstica.

Eu, por mim, vou comprar uma moto-enxada daquelas de jardim. Por 500 € faz de pequeno motocultivador a gasolina e poupa muitas horas de enxada tradicional.

Desde que vi o Dr. Jivago a cultivar batatas para matar a fome aos filhos e desde que assisti às dificuldades (algumas dramáticas) de retornados de Angola em 1975 que percebi que a fartura, a riqueza e a comida são realidades muito mais fluidas e contingentes do que as pessoas pensam.