A RATIO LEGIS DO ATRASO
Artigo 116.º
Atraso do início ou reinício dos jogos e da sua não realização ou conclusão
Atraso do início ou reinício dos jogos e da sua não realização ou conclusão
Em linguagem comum, cada lei é criada para recomendar certo comportamento e, em simultâneo, proibir ou evitar outros comportamentos. Chama-se ratio legis ao conjunto de motivos que levaram à criação da lei. Porque cada lei tem sempre uma motivação na sua origem.
No caso das regras aplicáveis à pontualidade no começo dos jogos de futebol, a primeira ratio tem a ver com a harmonia na realização do campeonato. Se a hora marcada é aquela, convém que todos os jogos comecem àquela hora. E, por isso, quem falhar, paga uma multa. Porque o bem jurídico que está protegido pela lei é a certeza no horário, visando que adversários e público e demais intervenientes saibam a que horas começa o espectáculo. E o nº 1 do artº 116º dá conta disso mesmo, ao prever a sanção por multa graduada em função da gravidade do desleixo de quem provoca o atraso.
Porém, há situações em que o atraso no início do jogo pode provocar prejuízos a terceiros. E a situação típica é a de certa equipa não se esforçar o suficiente do ponto de vista desportivo, conformando-se, por exemplo, com o empate. Recordo um campeonato do mundo, onde na fase de grupos, duas equipas se qualificavam se empatassem. E como o jogo entre essas equipas foi o último do grupo, ambas as equipas assumiram um comportamento anti-desportivo trocando vagarosamente a bola, não arriscando qualquer jogada de ataque, assumindo ambas que o melhor resultado era o empate. Isto só aconteceu, porque o jogo das outras equipas do mesmo grupo já tinha terminado e o respectivo resultado já era conhecido. Se os jogos tivessem ocorrido à mesma hora, certamente que aquelas oportunistas e batoteiras equipas se teriam esforçado muito mais, tentando ganhar o jogo, pois que o empate talvez não fosse suficiente para a qualificação.
Ora bem, quando a lei no nº 2 do artº 116 fala do prejuízo de terceiros, refere-se exactamente a situações em que um intencional atraso no início do jogo vise permitir que uma das equipas - ou ambas - deixe de se aplicar no jogo só com a intenção de prejudicar uma terceira equipa, violando assim a primeira regra do futebol, que é tentar marcar mais golos que o adversário.
Surpreendentemente, a queixa de Bruno de Carvalho - insisto em não envolver o Sporting nesta triste e lamentável figura - é no sentido de o FCPorto se ter aplicado em demasia - tanto que até marcou um golo nos descontos - porque beneficiou de ter sabido que o Sporting também ganhara o jogo acabado minutos antes. Querendo transformar a natural atitude competitiva do FCPorto numa coisa ilegal e ultrajante para o Sporting. Tanto que até prejudicou o Sporting. Como diria o outro, ai prejudicou, prejudicou. No futebol cada vez que se ganha, causa-se prejuízo aos outros. Nem se vê como possa ser de outro modo. Pelos vistos só Bruno de Carvalho é que não percebe esse pressuposto essencial do desporto de competição.
O FCPorto nunca teve a intenção de prejudicar anti-desportivamente o Sporting pela simples razão de lhe ser impossível causar qualquer prejuízo desse tipo, mesmo que o jogo se tivesse realizado com 2 horas de atraso.
Independentemente do horário, o FCPorto precisava de ganhar ao Marítimo. E ganhou pela diferença de um golo. Se a questão se colocasse na necessidade de marcar ao Marítimo mais um ou dois golos, ainda seria configurável em abstracto um benefício. Mas como a vitória foi por um golo e como tal vitória por um golo era suficiente para o apuramento, era impossível causar qualquer prejuízo anti-desportivo a terceiros, nos termos em que o mesmo está acautelado no preceito regulamentar aplicável.
Só se a vitória fosse possível por meio-golo é que Bruno Carvalho se poderia queixar pelo outro meio-golo marcado a mais que deu o apuramento.
No fundo, Bruno de Carvalho está frustrado pelo facto de o FCPorto ter jogado com toda a intensidade buscando uma vitória que só aconteceu nos momentos finais do jogo. Mas Bruno de Carvalho não tem o direito de exigir aos outros que não se esforcem tanto só para permitir que o seu Sporting ganhe.
Quanto muito, Bruno de Carvalho poderia queixar-se por o Marítimo ter deixado intencionalmente o FCPorto ganhar só para prejudicar o Sporting - se tiver lata ou descaramento para tanto. Porque no contexto, naquele contexto, só o Maritimo, em abstracto, poderia prejudicar o Sporting.
Agora e acusar o FCPorto de lhe causar prejuízo porque jogou até ao último minuto e conseguiu marcar um golo que lhe deu a vitória é completa demagogia e falta de senso.
Nem existiu qualquer beneficio ilegal, nem qualquer prejuízo para lá do rombo no ego inflamado do queixoso, nem a lei invocada por Bruno de Carvalho é sequer aplicável ao caso concreto. Aquela lei - o nº 2 do artº 116 - visa punir quem joga a menos, não é quem joga a mais.
Alguém que explique ao Senhor estas coisas para evitar que ele continue a largar demagogia barata.
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