sexta-feira, maio 07, 2010

EÇA

"- Talvez se riam. Mas eu sustento a semelhança. Aquele todo de Gonçalo, a franqueza, a doçura, a bondade, a imensa bondade (...). Os fogachos e entusiasmos, que acabam logo em fumo, e juntamente muita persistência, muito aferro quando se fila à sua ideia... A generosidade, o desleixo, a constante trapalhada nos negócios, e sentimentos de muita honra, uns escrúpulos, quase pueris, não é verdade?... A imaginação que o leva sempre a exagerar até à mentira, e ao mesmo tempo um espírito prático, sempre atento à realidade útil. A viveza, a facilidade em compreender, em apanhar... A esperança constante nalgum milagre, no velho milagre de Ourique, que sanará todas as dificuldades... A vaidade, o gosto de se arrebicar, de luzir, e uma simplicidade tão grande, que dá na rua o braço a um mendigo... Um fundo de melancolia, apesar de tão palrador, tão sociável. A desconfiança terrível de si mesmo, que o acovarda, o encolhe, até que um dia se decide, e aparece um herói, que tudo arrasa... Até aquela antiguidade de raça, aqui pegada à sua velha Torre, há mil anos... (...) Assim todo completo, com o bem, com o mal, sabem vocês quem ele me lembra?
- Quem?...
- Portugal."

(Última página de A Ilustre Casa de Ramires de Eça de Queiroz.)

1 Comments:

Blogger ups said...

Gosto disto mesmo assim,apesar de tudo o que me desgosta.

"Podia ser diferente,mas não era a mesma coisa".

Mas...devia ser diferente!?!?!?Sei lá!

Socialmente mais justo e equitativo, tenho esperança que venha a ser.Vamos lá,porra!


ups!

18:44  

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