A NOTÍCIA QUE PODE ACONTECER

Ser jornalista hoje em dia em Portugal não é narrar a notícia objectiva do facto. Contar a quem não viu porque não estava lá como se passaram as coisas. Nada disso. Ser jornalista em Portugal é dar a sua interpretação dos factos, formular os seus desejos subjectivos. Por vezes, até, dar como notícia uma não-notícia. Exemplo desta última foi a reportagem alargada a todas as capitais de distrito onde foram colocados repórteres por todas as estações televisivas para dar conta do mau tempo que a Protecção Civil tinha prometido. O mau tempo acabou por não se concretizar e todos os telejornais estiveram 20 minutos a percorrer os repórteres no terreno para cada um, à sua vez, dizer que "por aqui o mau tempo também não apareceu".

Doutra vez, a TVI esteva dois anos a garantir que "a Taxa Euribor pode subir em breve". Mesmo enquanto foi descendo por muitos e longos meses. Até que ao fim de dois anos a Euribor começou efectivamente a subir.

O jornalista português transformou-se num pantomineiro onde o dramatismo da entoação do falsete e o gesticular das mãos e até das orelhas se destinam a captivar a atenção do povo para umas notícias que já não são levadas a sério.
No âmbito desportivo, então, é de chorar por tanta miséria intelectual. A notícia da Bola, ali em cima, em caso algum poderia ter sido o que poderia vir a acontecer. Uma notícia ou foi ou não foi. Nunca pode ser uma probabilidade de vir a acontecer. Por isso - o voar para longe -, não era um facto, nem uma certeza. Era apenas uma possibilidade, um desejo. Ainda por cima, uma conclusão, nunca um facto. O qual, apesar de tudo, não se veio a concretizar. Sabe-se agora.

Mas às oito da manhã, doze horas antes dos factos, a RTP, o Canal do Estado, pago por todos nós, abriu as notícias com um "pode afastar-se numa liderança isolada".

Curiosamente, estes desvios da ética profissional são sempre assumidos na mesma direcção clubística. São especulações das redacções formuladas sempre no sentido da mesma côr. São desejos individuais dos jornalistas expressos na primeira página como se fossem notícias sérias, reais e idóneas. Mas não são. Nunca passaram de desejos ardentes de adeptos profissional e intelectualmente desonestos e inaptos.

Não, por favor, não me apelidem de anti-benfiquista, que o que escrevo nada tem contra o Benfica. Tenho, isso sim, é nojo deste jornalismo de merda. São coisas diferentes.

E quando acontecem desgraças desportivas ao Benfica, a euforia não é dirigida ao adepto benfiquista, tantas vezes o nosso melhor amigo, o nosso irmão ou o nosso vizinho. Esse sentimento de "bem-feita" é dirigido a estes idiotas destes jornalistas que não sabem dar notícias. Que não informam sobre o que aconteceu, que só falam sobre o que pode vir a acontecer. Ou seja, que se limitam-se a dar palpites e a cagar sentenças. Cobrindo tantas vezes o próprio Benfica de ridículo.